Diálogo de meia hora ocorre em meio à crise diplomática e ao tarifaço de até 50% imposto pelos EUA a produtos brasileiros

O presidente Luiz Inácio Lula da Silva e o presidente dos Estados Unidos, Donald Trump, conversaram por videoconferência na manhã desta segunda-feira. Segundo o Palácio do Planalto, o diálogo, de cerca de 30 minutos, teve tom amistoso e foi considerado positivo por ambos os lados.
O encontro virtual foi realizado a partir do Palácio da Alvorada e contou com a presença do vice-presidente Geraldo Alckmin, do ministro da Fazenda Fernando Haddad, do chanceler Mauro Vieira, do ministro da Secretaria de Comunicação Sidônio Palmeira e do assessor especial Celso Amorim.
A videoconferência havia sido combinada durante a Assembleia Geral da ONU, em Nova York, no mês passado, quando Lula e Trump se encontraram brevemente nos bastidores. Na ocasião, o norte-americano surpreendeu ao afirmar, durante seu discurso, que havia tido “excelente química” com o brasileiro. “Ele parece um cara muito legal, ele gostou de mim e eu gostei dele. Tivemos uma ótima química, e isso é um bom sinal”, declarou Trump na ocasião.
Pedido de Lula e resposta de Trump
Na conversa desta segunda-feira, Lula aproveitou para solicitar a retirada da sobretaxa de até 50% sobre produtos brasileiros imposta pelos Estados Unidos e para pedir a revisão das sanções aplicadas a autoridades brasileiras.
De acordo com nota divulgada pelo Planalto, o presidente classificou as medidas como “injustas” e destacou que o Brasil é um dos três países do G20 com os quais os Estados Unidos mantêm superávit na balança de bens e serviços.
Trump confirmou que o contato foi “muito bom” e afirmou que a conversa se concentrou em temas econômicos e comerciais. O norte-americano também confirmou que os dois líderes terão um encontro presencial “em um futuro não muito distante”, possivelmente “tanto no Brasil quanto nos Estados Unidos”.
Trump designou o secretário de Estado Marco Rubio para conduzir as negociações com os representantes brasileiros. Do lado do Brasil, as tratativas ficarão a cargo do vice-presidente Geraldo Alckmin, do ministro Fernando Haddad e do chanceler Mauro Vieira.
Possibilidade de encontro
Durante o telefonema, Lula sugeriu diferentes possibilidades para o primeiro encontro presencial entre os dois líderes. Entre elas, estão a Cúpula da Associação das Nações do Sudeste Asiático (Asean), prevista para o fim de outubro, na Malásia. O presidente brasileiro também reiterou convite para que Trump participe da COP30, a Conferência da ONU sobre Mudanças Climáticas, que será realizada em Belém (PA), em novembro de 2025, e se colocou à disposição para viajar aos Estados Unidos.
Os dois presidentes trocaram telefones pessoais para estabelecer uma via direta de comunicação, gesto interpretado como sinal de reaproximação diplomática após meses de tensão.
Crise diplomática e tarifaço
A conversa ocorre em meio à crise diplomática entre Brasil e Estados Unidos, iniciada em julho, quando Trump anunciou uma sobretaxa de 50% sobre produtos brasileiros, atingindo cerca de 36% das exportações do país.
Em carta enviada ao governo brasileiro, o norte-americano justificou a medida como resposta ao julgamento e à condenação do ex-presidente Jair Bolsonaro pelo Supremo Tribunal Federal (STF), afirmando que o processo representava “uma vergonha internacional” e “uma caça às bruxas”.
Trump chegou a declarar que a taxação também se devia aos “ataques insidiosos do Brasil contra eleições livres” e à “violação da liberdade de expressão de cidadãos americanos”. A medida também foi acompanhada por sanções a autoridades brasileiras, entre elas o ministro do STF Alexandre de Moraes e sua esposa, incluídos na lista da Lei Magnitsky, que bloqueia bens e proíbe entrada nos EUA.
Além disso, vistos de ministros e integrantes do governo brasileiro foram suspensos. Entre os atingidos estão o advogado-geral da União, Jorge Messias, e o ministro da Saúde, Alexandre Padilha.
Lula reagiu à decisão afirmando que o processo judicial contra os envolvidos nos atos golpistas de 8 de janeiro de 2023 é de competência exclusiva da Justiça brasileira e “não está sujeito a nenhum tipo de ingerência ou ameaça que fira a independência das instituições nacionais”.
Repercussão no governo
Após a videoconferência, o ministro da Fazenda, Fernando Haddad, afirmou que a conversa foi “positiva” e que uma nota oficial seria a expressão do teor do diálogo. Já o vice-presidente Geraldo Alckmin declarou estar “muito otimista” com a possibilidade de revisão do tarifaço.
“Foi uma conversa melhor do que esperávamos. O presidente Lula destacou a disposição do Brasil para o diálogo e para a negociação”, disse Alckmin. Ele também confirmou que Lula classificou como “injustas” as sanções impostas a autoridades brasileiras e pediu que elas sejam revistas.
O Planalto ressaltou que, durante o telefonema, Lula descreveu o contato como uma oportunidade para restaurar as relações amistosas de 201 anos entre as duas maiores democracias do Ocidente.
Relação delicada e perspectivas
Desde que Trump reassumiu a presidência dos Estados Unidos, no fim de 2024, a relação com o governo brasileiro tem sido marcada por cautela e desconfiança mútua. Diplomatas em Brasília e Washington afirmam que a diplomacia brasileira atua de forma discreta, devido ao histórico de mudanças bruscas de posição do líder norte-americano.
Mesmo assim, o governo brasileiro vê na recente conversa um sinal de distensão e aposta em uma reaproximação pautada no comércio e no investimento. Entre os temas de interesse mútuo estão a regulação de big techs, a transição energética e a exploração de terras raras – setores considerados estratégicos por ambos os países.
O encontro presencial entre Lula e Trump ainda não tem data definida, mas, segundo fontes do Itamaraty, a tendência é que ocorra em solo neutro, como a própria Malásia, durante a reunião da Asean.
FONTE G1